Rota: Cachoeira do Sul / Rio Pardo / Vera Cruz / Candelária / Cachoeira do Sul
Distância percorrida: 200 km
No verão de 2008 eu escrevi aqui sobre Alegrete, a 3ª capital Farroupilha; de lá para cá não surgiram outras oportunidades de continuar falando sobre a Guerra dos Farrapos, mas agora retomo o assunto de uma maneira mais ampla, abrangendo locais históricos, como Rio Pardo (um dos 4 municípios mais antigos do Rio Grande do Sul e que deu origem a outros 200), o Passo São Lourenço (em Cachoeira do Sul) e Caçapava do Sul (a 2ª capital Farroupilha).
Rio Pardo
Sede dos Dragões do Rio Pardo, a Fortaleza Jesus, Maria, José do Rio Pardo – ou Tranqueira Invicta, assim denominada por nunca ter sido rendida – é o local de um dos mais importantes eventos da Revolução Farroupilha: a 30 de abril de 1838, o forte antes invicto foi tomado por 2.500 homens comandados por Bento Manuel Ribeiro e Antônio de Sousa Neto e deu impulso à rebelião. Neste período, Rio Pardo tinha quase o dobro dos habitantes de Porto Alegre e lá se encontrava a Banda Imperial, sob o comando do maestro mineiro Joaquim José Mendanha, que viria a compor (por mais contraditório que isso possa parecer), a pedido de Bento Gonçalves, o Hino Nacional da República Rio-Grandense.
Os primeiros 20 quilômetros que separam Cachoeira do Sul de Rio Pardo dão uma falsa sensação de tranquilidade ao usuário da rodovia: asfalto de boa qualidade, sinalização, pintura na pista… Tudo nos conformes. De uma hora para outra, tudo some e o piloto fica entregue à própria sorte (ao longo de mais 70 quilômetros) e a minha não estava das melhores, tanto que errei um trevo e quase fui parar no distrito de Bexiga. Corrigida a rota, restou manter a moto aprumada no cascalho e, pior dos pisos por onde passei, no barro deformado durante as chuvas e que depois de seco vira um trilho de trem de onde é difícil sair.
Livre das armadilhas da RS-403, fui à Praia dos Ingazeiros, às margens do Rio Jacuí – o bucólico local contribui muito para uma refeição tranquila -, e experimentei a famosa traíra do local; a fama é mais do que justificada e o filé de peixe (acompanhado de fritas, salada, molho, arroz e pão) merece uma menção honrosa.
Dali até Vera Cruz utilizei a BR-471 (pedagiada, motos não pagam) e a ERS-471 e em pouco tempo estava no caminho de chão batido que me levaria de volta à Cachoeira do Sul. Pelo caminho, uma estrada que mais parecia um leito de rio, coberto de pedras, e uma patrola trabalhando em um segmento que não comportava outro veículo: a solução foi a monstra chegar um pouco para o lado e eu passar sobre o mato, numa peripécia que deve ter divertido quem estava olhando.
O leito de rio (ou a estrada, como queira), depois da surra de Maricá em Osório, me deu a segunda lição: as botas específicas para off-road possuem uma biqueira de aço por que a pedras atiradas pela roda dianteira acertam o dedão em cheio e, acredite, dói muito. Como esse expediente se repetiu ao longo de vários quilômetros e minha bota se revelou ineficiente, cheguei ao final da motocada com o dedão do pé esquerdo (que por algum motivo foi o mais alvejado) latejando.
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Rota: Cachoeira do Sul/São Sepé/Caçapava do Sul/Cachoeira do Sul
Distância percorrida: 230 km
Passo São Lourenço
Segundo a Academia de História Militar Terrestre do Brasil, foi no Passo São Lourenço que o General João Paulo dos Santos Barreto, Comandante das Armas, concentrou um exército de 5.000 homens para adentrar a campanha e travar uma batalha campal contra os republicanos. A estratégia, entretanto, se revelou inadequada e o general chegou ao final de sua empreitada destituído do comando, com a cavalaria quase a pé e desfalcada pela disenteria, pestes e deserções.
Localizado no distrito de Ferreira, o Passo São Lourenço se abre como o mar à frente do visitante: desde o centro de Cachoeira do Sul, são pouco mais de 15 quilômetros (a maioria de asfalto) até a balsa que em poucos minutos leva moto e motoqueiro até o outro lado do Rio Jacuí por R$ 2.
Já na outra margem, segui em direção ao oeste com o objetivo de, em algum momento, virar à esquerda e tomar o rumo sul para aproveitar as estradas sem pavimento até Caçapava do Sul; na prática, entretanto, são tantas as bifurcações – e o GPS obviamente desconhece todas as estradas da região – que acabei seguindo o caminho que parecia ser o certo e acabei em São Sepé (o objetivo inicial era sair na BR-290 e de lá partir para outra estrada vicinal, mas o bom de motocar sem destino é que mesmo um erro no trajeto se transforma em parte da aventura).
Não demorei muito (tempo suficiente para abastecer a moto e comer um pastel) na cidade que homenageia o guerreiro guarani Sepé Tiaraju e logo tomei a BR-392 em direção a Caçapava do Sul: a estrada está em ótimas condições – com asfalto perfeito, terceira pista, etc – e justamente por isso não estava nos meus planos; restou utilizá-la e pelo caminho observar as saídas para as estradas de chão batido para voltar por uma delas.
Caçapava do Sul
Centro de abastecimento imperial, a segunda capital Farroupilha foi tomada – juntamente com 15 peças de artilharia, 4.000 armas de infantaria e farta munição, que mais tarde seriam utilizados na conquista de Rio Pardo (no dia 8 de abril de 1837) – pelo general Antônio de Sousa Neto depois de 7 dias de cerco. A mesma Caçapava, considerada inexpugnável por conta de sua posição geográfica, seria invadida pelos imperiais, o que forçaria a instalação da capital em Alegrete no dia 28 de março de 1840.
Demorou, mas finalmente a visita à segunda capital da República Rio-Grandense se concretizou e pude ver de perto os prédios históricos e as ruas antigas da Paragem de Caçapava (em tupi-guarani, Caçapava significa clareira na mata) que foram palco de importantes batalhas. Difícil escolher o que visitar e para onde apontar a máquina fotográfica; de meu gosto, entretanto, o que restou do Forte D. Pedro II é o ponto turístico mais interessante da cidade, tanto pela beleza quanto pela história que a local guarda.
Depois de algum tempo caminhando (e outro tanto motocando) pelas ruas da cidade, voltei à estrada para tomar o rumo de Cachoeira do Sul; como na vinda eu havia visto a saída para a estrada de chão que leva à BR-153, rapidamente voltei à diversão no sobe e desce das estradas vicinais de Caçapava do Sul.
Por fim, antes do destino final, um último trecho sem pavimento: a RS-705, estrada que liga as BRs 290 e 153 já em Cachoeira do Sul. Antes de encostar a Tornado – que aliás se comportou muito bem durante esses dois dias – na garagem e a carcaça cansada no sofá, registrei a ponte sobre o Rio Jacuí (que, com o volume de água baixo, permitiu que eu fotografasse a Barragem do Fandango).
Dois dias, 330 quilômetros rodados, muitos anos renovado.
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